No Rock in Rio, nada é como aparenta ser. Estes 39 anos celebrados agora como 40 comportam na verdade duas vidas bem diferentes. A primeira engloba as três primeiras edições, todas muito diversas entre si, com intervalos irregulares: 1985, 1991 e 2001. A segunda vida começa a partir de 2011, fase em que o evento e a marca se impõem como negócio, influenciando nas escolhas das atrações. Nesta sexta (13) começa o Rock in Rio 2024, com Ed Sheeran, Katy Perry, Travis Scott, Imagine Dragons, Shawn Mendes e até Will Smith, além de muitos brasileiros.
Relembre a seguir os momentos históricos do festival.
1985: O começo de tudo
O primeiro Rock in Rio, de 1985, tem uma aura mítica incomparável. Pelo ineditismo, por descortinar um mundo de atrações, foi como um desembarque de extraterrestres e semideuses inacessíveis.
E também um choque de universos, que começou com um show de intolerância dos metaleiros, os jovens fãs de heavy metal assim batizados por uma reportagem de Glória Maria na TV Globo. Logo na abertura, em 11 de janeiro, em Jacarepaguá. Ney Matogrosso não deve ter acreditado quando ouviu as primeiras vaias. Xingou de volta e usou a raiva que estava sentindo para seguir em frente. No fim, conseguiu superar as hostilidades. Só não foi poupado dos gritos de “viado!” — ironicamente emitidos por rapazes ansiosos para ver logo Freddie Mercury de collant branco. Ao longo do festival, Erasmo Carlos, Kid Abelha e Eduardo Dusek também sofreriam com reações agressivas.
Naquele primeiro dia, o Iron Maiden selou com o sangue de Bruce Dickinson o começo de uma longa relação com o Brasil. Durante Revelations, o cantor bateu com a cabeça no braço da guitarra, e o sangue escorreu por sua fronte. Irritado porque não conseguia ouvir o som do instrumento, fulo da vida com o cara do monitor, ele quebraria a guitarra fora dos holofotes. Mas foi instruído pelo empresário Rod Smalwood a não limpar o sangue com uma toalha: deixa sangrar!
Quando o Queen entrou em cena, quase às 2h da manhã, Freddie Mercury, vestindo collant branco (e jaqueta de couro), foi recebido com devoção, sem homofobia. No entanto, algumas músicas mais tarde, ao aparecer em trajes femininos, com peruca e peitos falsos, para cantar I Want to Break Free, reproduzindo o famoso clipe, foi alvejado por bolinhas de papel e outros objetos. Mas o que a história registra é o mito, a apoteose popular durante a balada Love of My Life, cantada por 250 mil pessoas.
O festival foi batizado e nasceu sob o signo do rock, porém desde 1985 o usou mais como marca e posicionamento do que como direção ou algema musical. Tão marcantes quanto Yes, Queen, Iron Maiden, Whitesnake, Ozzy Osbourne, AC/DC, Scorpions e Rod Stewart foram as baladas de James Taylor e os brasileiríssimos Alceu Valença, Baby Consuelo (de baby doll, supergrávida de Kriptus Rá) e Pepeu Gomes, Moraes Moreira, Gilberto Gil (de visual new wave e show com pegada “danceterias”) e Ivan Lins. Menos lembrada, Elba Ramalho, “Tina Turner do sertão”, também arrasou com baião, xote, xaxado, rojão, samba-enredo e o frevo.
Historicamente, o Rock in Rio coincidiu com o começo da mais longa era democrática da história do Brasil: em 15 de janeiro de 1985, com a eleição indireta de Tancredo Neves, o ator Kadu Moliterno, mestre de cerimônias do festival, começou a tarde saudando “Muda, Brasil!” e chamando Kid Abelha & Seus Abóboras Selvagens, para “o primeiro show da democracia brasileira!”.
Os metaleiros que estavam ali para ver AC/DC e Scorpions foram implacáveis, e a banda carioca saiu correndo do palco, após 35 minutos. Eduardo Dusek também sofreu, mas não deixou por menos, vociferando ao final: “As pessoas que estão jogando coisas no palco têm mais é que ser linchadas”.
Assim caminhou a democracia brasileira em seus primeiros passos pop. Só houve trégua para o Barão Vermelho, liderado por um Cazuza bronzeado e musculoso. Enrolado na bandeira brasileira, ele discursou, no meio de Pro Dia Nascer Feliz, na imagem perfeita para o encerramento dos telejornais: “Que o djia nasça filij amanhã pra todo mundo. Um Brasil novo… uma rapaziada ishpertaaa”.
1991: Nove dias de rock e cheiro de xixi
O Rock in Rio só voltaria a ser realizado, no Maracanã, em janeiro de 1991. Foi a mais caótica das edições, por causa do local, pouco estruturado para um evento do tipo. Houve tumultos no acesso, três mortes (duas não relacionadas aos problemas nos portões: uma por tiro, outra por overdose) e um slogan informal: “nove dias de rock e cheiro de xixi”. Gal Costa e Robert Plant foram desistências de última hora. Santana entrou no lugar do ex-Led Zeppelin, e coube ao jamaicano Jimmy Cliff, habituê do Brasil, abrir o festival. O autor do hino de protesto Vietnam substituiu Gal com bom astral e um discurso pacifista em boa hora; a Guerra do Golfo comia solta.
O Faith No More, um dos cachês mais baixos entre os gringos, roubou a cena do Guns N’ Roses. A turma do desencapado Mike Patton deu show de vitalidade e comoveu até os ouvidos pop com sua versão de Easy, dos Commodores, no bis. Pouco entrosado (o baterista Matt Sorum nunca havia sequer ensaiado com Axl Rose; Izzy Stradlin fez sua estreia), o Guns decepcionou também pelo repertório e pela emissão vocal deficiente (terminou o show rouco) de Axl.
Com os ídolos pop, não teve tempo ruim. A-ha e INXS deram tudo que as cerca de 200 mil pessoas queriam. E George Michael superou todas as expectativas, com um show-baile inesquecível.
O gênio Prince se apresentou duas vezes (suas únicas apresentações no Brasil; em 2011, cancelaria uma nova vinda em cima da hora). Na primeira data, entrou com duas horas de atraso, foi xingado de “viado” pelo público, mas logo tomou conta de tudo, corrigindo: “Rio! Rio! My name is Prince!”. Caetano descreveu o show como “o melhor que já vi na vida”. O Maracanã viveu momentos apoteóticos em Purple Rain, Kiss, Nothing Compares 2 U e, no bis, Respect (de Otis Redding, associada a Aretha Franklin).
Na segunda noite do astro americano, seu palco teve problemas, e sobrou para Alceu Valença, que precisou atuar em uma estrutura improvisada. Mesmo na adversidade, o pernambucano fez um show incrível, dominando o Maracanã com seus hits e fechando com Cantiga do Sapo (Jackson do Pandeiro). Elba Ramalho também brilhou, indo além do que fez em 1985: trouxe o Olodum como reforço e incluiu no roteiro Vida, hit único da banda afrobrasileira Obina Shok.
Em novo capítulo de humilhação para os artistas brasileiros, no dia do metal, Lobão, também com palco reduzido (tomado pela parafernália do Judas Priest, que viria depois), ficou apenas seis minutos cantando. “Vá tratar mal na pqp. Vão todos tomar no c…”, bradou o cantor, depois de alvejado por pilhas, latas de cerveja e cusparadas. A bateria da Mangueira entrou e tocou sozinha, antes da catarse heavy. O show do Megadeth marcou gerações de bangers, e o Judas Priest, com Rob Halford entrando de Harley Davidson no palco, um memorável atropelamento sonoro.
2001: Se o mundo fosse nosso outra vez…
Em 2001, o festival ressurgiu em Jacarepaguá, com capacidade anunciada de 250 mil espectadores por dia, bem acima do desejável para o conforto e a segurança do público. No dia mais cheio, 21 de janeiro, houve tumulto e invasão na entrada, arrastão no gramado e ambiente tensionado pela hiperlotação.
O novo storytelling da marca gerou um sobrenome/tagline: Rock in Rio — Por um mundo melhor. Na abertura, foram observados três minutos de silêncio, com mais de duas mil rádios e 500 TVs “se calando” juntas, em nome de uma suposta melhoria do mundo (ironicamente, meses antes dos atentados de 11 de setembro, triste marco histórico deste milênio). Seguiu-se uma versão esquecível de Imagine com Gilberto Gil e Milton Nascimento.
A estrutura geral se aproximou do formato atual, com ampliação de espaços vips e reservados às marcas patrocinadoras. E uma bem-vinda inovação, aos moldes dos festivais internacionais, os palcos secundários menores: Tenda Raízes, com 23 atrações de world music como o casal malinês Amadou e Mariam, o congolês Ray Lema e Uakti; Tenda Brasil, que bombou abrigando nomes imensos como Los Hermanos, Luiz Melodia, Jair Rodrigues e Sá, Rodrix e Guarabyra (num reencontro histórico), e Tenda Eletro, acolhendo talentos da cena eletrônica queridinha da mídia de então.
Na Tenda Mundo Melhor, debates sobre temas como “Fé e espiritualidade” foram conduzidos por escritores como Paulo Coelho, aplaudido como popstar, e Leonardo Boff.
O que fez história, porém, foram shows como o do R.E.M., atração inédita no Brasil. Michael Stipe estava positivamente impactado por caipirinhas e pela “cidade mais sexy que já conheci”, como definiu. Também inesquecível foi a primeira passagem do legendário Neil Young pelo País: ele entrou em cena à 1h20 e tocou com seus amigos do Crazy Horse para menos da metade da lotação (100 mil pessoas) até 3h10.
Outra apresentação marcante começou à luz do dia, às 18h, no Sunset: a de Cássia Eller, alternando-se entre o suave e o visceral, com convidados como a Nação Zumbi. Durante Come Together, dos Beatles, ela levantou a blusa e mostrou os seios, em gesto antiobjetificante. Encerrou com Smells Like Teen Spirit, do Nirvana, numa versão que impressionou Dave Grohl. Depois, no show do Foo Fighters, Cássia subiu ao palco, deu um longo e afetuoso abraço (e uma tentativa de patolada) em Grohl, aniversariante do dia. Ela morreria no fim daquele 2001.
Oasis fez um show burocrático, com Liam pouco audível, e o Queens of the Stone Age, banda em ascensão, chamou atenção mais pelo folclore. O baixista Nick Oliveri entrou peladão, tocou assim por vinte minutos e quase foi preso ainda no palco. Mas se vestiu, e a banda pôde terminar o show, após uma jam caótica com capoeiristas.
Com uma formação desfigurada, o Guns N’ Roses não fez má figura. Mas desrespeitou o público ao entrar após duas horas de atraso. O roteiro incluiu uma inusitada cover de Tim Maia (Sossego) cantada pelo guitarrista Robin Finck e uma sincera homenagem de Axl Rose à brasileira Beta Lebeis, sua “babá”, empresária e assistente pessoal. O vocalista bad boy até chorou.
No dia dos ídolos teen, Sandy e Junior deram uma aula de pop superproduzido, com competência vocal ao vivo e presença de palco (em especial, de Junior). Aos 19 anos, Britney Spears abusou do playback em um show truncado. Acabou sendo vaiada ao mostrar uma bandeira dos EUA. Por uma falha técnica, seu microfone ficou aberto durante um intervalo e foi possível ouvi-la aos palavrões, reclamando de um problema no figurino (um áudio que hitou no Napster, programa de compartilhamento gratuito de arquivos que bagunçava a indústria da música naquele tempo). Outro mico foi o show do ídolo infanto-juvenil Aaron Carter, 20 minutos de playback tidos como o pior show do palco principal em todas as edições do Rock in Rio.
Em uma edição marcada também por um levante/boicote de Rappa, Skank, Raimundos, Cidade Negra, Charlie Brown Jr. e Jota Quest, insatisfeitos com as condições dadas às bandas nacionais, não faltaram cenas de intolerância agressiva por parte do público. Xingado e vaiado, Carlinhos Brown confrontou a turma: “Vocês, do rock, têm muito o que aprender na vida, aprender a amar. E o dedinho, podem enfiar no traseiro”. Como resposta, enfrentou uma chuva de garrafas plásticas de água mineral. O mundo não estava mesmo melhorando.
2011: E era dia de rock, bebê
Uma década depois, em 2011, após um tempo de exílio (quatro edições em Lisboa e duas em Madri), o festival voltou ao Brasil e inaugurou sua fase II com 160 atrações e 700 mil pagantes ao longo de sete dias. Ele já desembarcou com os “acessórios” extramusicais ligados a patrocinadores que se tornariam parte essencial da marca Rock in Rio: tirolesa, montanha russa, free fall e roda gigante.
Trouxe também uma boa novidade, o Palco Sunset (conceito inaugurado em Lisboa, em 2008), aberto a nomes de apelo médio (Mike Patton em seu projeto paralelo Mondo Cane) e encontros especiais, como foram o de Milton Nascimento com Esperanza Spalding e o do Sepultura com o grupo Les Tambours du Bronx.
Maior que tudo, claro, foi o show do genial Stevie Wonder, com feat. de Janelle Monáe, então jovem promessa do R & B, e versões de Garota de Ipanema e Você Abusou (de Antonio Carlos e Jocáfi), uma obsessão do cantor desde os anos 1970 (“Take me to Bahia”, pediu Stevie ao público).
Ivete Sangalo, que hoje soma 19 participações no festival, fez seu primeiro show em edições brasileiras, com total eficiência. E ainda se divertiu participando do aulão pop de Shakira (em uma versão bagunça de País Tropical). Katy Perry e Maroon 5 também se saíram bem.
Para Claudia Leitte, porém, a tentativa de acompanhar as megaproduções gringas deixou um gosto amargo: no gran finale de seu show, teve que passar longos segundos pendurada de cabeça para baixo por cabos de aço, balançando as perninhas.
O Coldplay, menos alvo de hate do que hoje em dia, se consagrou com o coro de 125 mil pessoas em Viva la Vida.
Mas a edição 2011 foi marcada mesmo pelo surgimento do bordão/meme “hoje é dia de rock, bebê”, frase proferida por uma animadérrima Christiane Torloni em entrevista ao vivo no primeiro dia do evento.
Para os roqueiros, houve uma apresentação impactante do System of a Down (Ivete se disse fã) e o atropelamento Slipknot, em que até a parte acrobática (que viria a ser tendência no Rock in Rio) funcionou melhor, com um incrível ultramosh dado pelo DJ Starscream.
O Metallica também soube valorizar sua primeira vez no Rock in Rio em solo carioca: reservou um momento especial no setlist (Orion) e sensibilizou velhos fãs com um abraço em um bandeirão lembrando o baixista Cliff Burton (1962-1986).
2013: Bruce Springsteen nos braços do povo; Beyoncé nos passos do funk
Em 2013, mesmo apostando na diminuição do público (15 mil ingressos a menos a cada dia), não foram evitados problemas para o deslocamento dos fãs e vazamento de som entre palcos. Nomes como Offspring e Helloween, escalados para o Sunset, poderiam ter sido acomodados no Mundo. Os dois dias “metal” foram um trunfo, com Motörhead, Sepultura, Slayer (que deixou lindos hematomas na memória afetiva de toda uma geração de bangers), velhos (Iron Maiden, terceira vez, desde 1985) e novos (Metallica, segunda vez) “fregueses” do festival rendendo bem. Também deu certo a aposta no grupo britânico Muse como atração de fundo, explorando som e luz talhados para grandes espaços.
Trazer Beyoncé no auge seria o maior gol da edição — e rolou até surpresa simpática no final, a citação do funk/meme do momento em 2013, Passinho do Volante (Ah! Lelek Lek Lek). Mas houve Bruce Springsteen em 2h40 de palco, abrindo com Sociedade Alternativa, de Raul Seixas, se jogando na plateia e recebendo fãs para bailar no palco durante Dancing in the Dark. A “biografia” oficial Rock in Rio — A História, de Luiz Felipe Carneiro, classifica como o melhor show de todas as edições do festival. Ficou eternizado o cântico “Olê, olê, olê, olê, Brucê, Brucê”!
Em 2015, com o complexo de entretenimento ampliado (karaokê e capela para casamentos à moda Las Vegas), a parte musical entra em fase previsível, de figurinhas repetidas (Queens of The Stone Age, System of a Down). Fugiram da norma Angélique Kidjo (revivendo o clima da finada Tenda Raízes, de 2001), Gojira, Royal Blood, Korn, Ministry, Marcos Valle com Al Jarreau, Eumir Deodato, Sérgio Mendes com Carlinhos Brown (sem garrafadas), Toni Tornado, aos 85 anos, e um João Donato exilado no espaço Rock Street.
Na batalha de divas pop, houve novo round entre Katy Perry, circense demais, sem repetir o sucesso de 2011, e Rihanna, em show curto. Teve também Metallica (com problemas de som), Faith No More com mosh em falso de Mike Patton (caiu no fosso dos fotógrafos), Rod Stewart em modo Las Vegas, A-ha com a competência e os hits de sempre, e Elton John se redimindo da performance opaca de 2011.
Celebrando 30 anos, o festival se viu à vontade para manifestar seu umbiguismo — aprovado pelo público no Tributo a Cássia Eller (com direito a toplessaço coletivo para citar 2001), mas ridicularizado em iniciativas como a venda de potinhos com “lama de 1985″ (a R$ 185).
No fim das contas, o Queen com o vocalista Adam Lambert causou impacto, a despeito do retrogosto de história repetida como cover.
2017: 3h30 de Gun’s…ainda bem que tinha roda gigante
Em 2017, confrontos na Rocinha atrapalharam o clima festivo e o acesso à Barra em dois dos dias de show. O aspecto positivo foi a consolidação do Parque Olímpico, com 300 mil metros quadrados (o dobro da área disponível anteriormente), como espaço definitivo para o Rock in Rio.
O esgotamento na programação ficou evidente, com atrações nacionais do Palco Mundo repetidas e mais do mesmo (aprovado pelo público, é verdade) no rock internacional: Bon Jovi (campeão nas menções em rede social), Guns N’ Roses (com um exaustivo, ainda que elogiado, show de 3h30!), Chili Peppers… Alicia Keys e Tears For Fears entregaram apresentações memoráveis. The Who, biscoito fino do line-up, fez sua primeira e histórica aparição no Brasil, garantindo a credibilidade rock do evento (junto com Alice Cooper, que inclui feat. do malucão Arthur Brown).
Nas redes, porém, repercutiu muito menos que a estreia sul-americana do ídolo pop Shawn Mendes, 19 anos. Pabllo Vitar, como atração surpresa do espaço de um banco, fora dos palcos oficiais, também causou mais — e ainda roubou a cena no show de Fergie. Hypes fora, no entanto, o bailão de Nile Rodgers & Chic no Sunset foi lembrado como o melhor momento musical da edição.
2019: Mais uma vez, o bom e velho rock valeu o ingresso
Dois anos depois, o Rock in Rio, sempre pródigo em alardear seus feitos, voltou se dizendo “maior e melhor”. As atrações: 250 artistas e novos espaços como Nave, Palco Supernova, Rock Street Ásia e Espaço Favela, com abertura para gêneros populares, em conexão direta com a cultura da periferia e as comunidades vizinhas — BK, Xamã e Cidinho & Doca foram alguns dos destaques. Entre as atrações maiores, Ivete na quinta edição seguida, e mais repetecos: Red Hot Chili Peppers, Iron Maiden, Bon Jovi, Scorpions (veteranos de 1985, aclamados em pesquisa de público como o melhor show da edição)…
Foo Fighters, retornando ao festival depois de 18 anos, causou comoção. Já Drake, primeiro rapper a figurar entre os headliners, representou mal: fez um show sem alma, na base do “pega o dinheiro e sai correndo”. A abertura do evento apostou em outra “primeira vez” micada: na apresentação de Alok, o que mais chamou a atenção foi o coro do público com insultos a Bolsonaro durante um break.
Melhor conexão com o contemporâneo coube à americana Pink!, juntando a energia pop-rock com certo “fator tirolesa” nas ousadas acrobacias de palco.
2022: o ano dos Racionais
Em 2022, edição marcada pela mesmice na programação musical e pela ampliação do parque de diversões (com expansões para as arenas olímpicas), houve ao menos um desastre: o problema de som que tornou impossível ouvir e acompanhar o show de Avril Lavigne no Palco Sunset (“palco mudo”, como ridicularizaram alguns). No line-up dominado pelo pop, Dua Lipa, com ou sem playback, encantou, e Post Malone, com ou sem grandes talentos musicais, se consagrou.
Veteranos do rock como Billy Idol e Axl Rose protagonizaram noites de absoluto fiasco vocal. Entre as grandes atrações, deixaram boa impressão (no rock), o Green Day, com repertório retrô, e (no funk brasileiro), Ludmila, com muitos feats. — entre eles o de Tati Quebra-Barraco. Racionais MC’s foi o que mais se aproximou do adjetivo histórico, ainda que escalado no palco Sunset.
2024: Mais marcas e selfies; menos emoção
Hoje o Rock in Rio é uma grande marca, com imensa importância econômica, mas reduzida mística artística.
Com o Rio mais do que estabelecido como palco de grandes eventos globais, o desafio agora, para além das questões econômicas, passa por corrigir o desequilíbrio gigante entre carisma e rentabilidade.
Mas será que isso realmente importa? Barateada e comercializada como serviço, a música importa cada vez menos no business dos grandes eventos. Em tempos pós-pandêmicos, ainda há um público disposto a pagar preços altíssimos pela “experiência”. Na vida de aparências das redes sociais, estar — e, mais do que isso, postar — fotos e vídeos de si mesmo em um festival é item fundamental para, como diziam os sumérios, “agregar valor” à sua marca pessoal. Afinal, as utopias ficaram para trás. E lorotelling que se sonha junto é realidade.
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(Foto: Rock in Rio/Divulgação)