Por Caio Gottlieb
Sobre a reforma tributária, expus minha opinião há poucos dias aqui no blog na seguinte nota:
“Era imperiosa a necessidade de uma mudança radical no sistema de impostos do país, considerado o mais anacrônico, esdrúxulo e injusto do planeta.
Tinha-se como bastante razoável, nesse sentido, o texto original da reforma ora em curso, idealizada com o nobre propósito de buscar maior justiça fiscal através de regras modernas que simplificassem a arrecadação dos tributos, mas com o solene compromisso de não aumentá-los de jeito nenhum.
Pelo andar da carruagem, o primeiro objetivo, a duras penas, deve ser alcançado, mas não há mais tanta certeza quanto ao segundo.
Depois de ser desfigurado ao passar inicialmente pela Câmara Federal e sofrer novas distorções ao ser aprovado no Senado, o projeto voltou para análise dos deputados repleto de exceções resultantes da atuação de lobbies poderosos que trabalharam com afinco para proteger segmentos empresariais com melhor articulação política no Congresso Nacional.
O saldo final dessa esculhambação é que provavelmente teremos um imposto único de 28%, que será o mais alto do mundo, acarretando um consequente aumento brutal da tributação a recair especialmente sobre o setor de serviços, que inevitavelmente cobrará a conta no bolso dos consumidores.
Já existem motivos mais do que suficientes para se começar a desconfiar que a tão esperada e desejada reforma tributária vai se transformar em um verdadeiro presente de grego.
Vê-se um esforço de décadas caminhando em direção ao fracasso.
Vamos nadar, nadar, nadar, pra acabar morrendo na praia.
Como diria Roberto Campos, o Brasil não perde a oportunidade de perder uma oportunidade”.
Contudo, o negócio era aprovar a reforma a qualquer custo para que o governo, em ano de escassas realizações e muitos reveses no Congresso, tivesse alguma conquista importante para exibir, pouco importando a imensidão de dúvidas, questionamentos e receios que pairam sobre ela. E assim foi feito.
Ainda não é o fim do mundo. Vem agora a regulamentação das normas e o início paulatino da implantação das mudanças, que só estarão plenamente em vigor dentro de dez anos. Veremos muita água passando debaixo da ponte daqui até lá.
Mas é grande a preocupação com o monstrengo aprovado nesta sexta-feira (15), como se vê no comentário que o economista Marcos Cintra, professor da FGV, ex-deputado federal por São Paulo e ex-secretário da Receita Federal, publicou em suas redes sociais, que reproduzo abaixo:
“Mais uma vitória da política sobre a economia.
Atravessamos o ponto sem retorno na reforma tributária. A sorte está lançada.
Acompanho com muita apreensão a aprovação da reforma tributária.
Venceu a política, perdeu a economia; venceu a tecnocracia, perdeu a experiência; venceu o academicismo, perdeu o traquejo; venceu o favoritismo, perdeu o espírito público; venceu o mimetismo, perdeu o realismo.
A reforma é um salto no escuro que dará início a profundas divergências e graves consequências para colocar o modelo do IBS em pé.
Aos poucos a dura realidade da PEC 45 vai aparecer, com consequências econômicas e judiciais conflitantes.
E nesse cadinho de divergências surgirá uma contrarreforma para complementar e corrigir pontos polêmicos.
Uma reforma pontual e infraconstitucional teria sido mais eficiente e mais rápida para corrigir os defeitos amplamente conhecidos de nosso sistema tributário, e sem a disrupção institucional da PEC 45.
A ficha vai cair e ficará claro que esta reforma criará inúmeros problemas econômicos que levarão outras décadas para serem corrigidos.
O Brasil está entrando em uma trajetória de enorme desperdício de tempo e de energia.”
Faço minhas as palavras dele.
Só nos resta orar.
Caio Gottlieb é jornalista, publicitário e editor do blog caiogottlieb.jor.br