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04/05/2024

Consummatum est

Por Caio Gottlieb

 

Sobre a reforma tributária, expus minha opinião há poucos dias aqui no blog na seguinte nota:

 

“Era imperiosa a necessidade de uma mudança radical no sistema de impostos do país, considerado o mais anacrônico, esdrúxulo e injusto do planeta.

 

Tinha-se como bastante razoável, nesse sentido, o texto original da reforma ora em curso, idealizada com o nobre propósito de buscar maior justiça fiscal através de regras modernas que simplificassem a arrecadação dos tributos, mas com o solene compromisso de não aumentá-los de jeito nenhum.

 

Pelo andar da carruagem, o primeiro objetivo, a duras penas, deve ser alcançado, mas não há mais tanta certeza quanto ao segundo.

 

Depois de ser desfigurado ao passar inicialmente pela Câmara Federal e sofrer novas distorções ao ser aprovado no Senado, o projeto voltou para análise dos deputados repleto de exceções resultantes da atuação de lobbies poderosos que trabalharam com afinco para proteger segmentos empresariais com melhor articulação política no Congresso Nacional.

 

O saldo final dessa esculhambação é que provavelmente teremos um imposto único de 28%, que será o mais alto do mundo, acarretando um consequente aumento brutal da tributação a recair especialmente sobre o setor de serviços, que inevitavelmente cobrará a conta no bolso dos consumidores.

 

Já existem motivos mais do que suficientes para se começar a desconfiar que a tão esperada e desejada reforma tributária vai se transformar em um verdadeiro presente de grego.

 

Vê-se um esforço de décadas caminhando em direção ao fracasso.

 

Vamos nadar, nadar, nadar, pra acabar morrendo na praia.

 

Como diria Roberto Campos, o Brasil não perde a oportunidade de perder uma oportunidade”.

 

Contudo, o negócio era aprovar a reforma a qualquer custo para que o governo, em ano de escassas realizações e muitos reveses no Congresso, tivesse alguma conquista importante para exibir, pouco importando a imensidão de dúvidas, questionamentos e receios que pairam sobre ela. E assim foi feito.

 

Ainda não é o fim do mundo. Vem agora a regulamentação das normas e o início paulatino da implantação das mudanças, que só estarão plenamente em vigor dentro de dez anos. Veremos muita água passando debaixo da ponte daqui até lá.

 

Mas é grande a preocupação com o monstrengo aprovado nesta sexta-feira (15), como se vê no comentário que o economista Marcos Cintra, professor da FGV, ex-deputado federal por São Paulo e ex-secretário da Receita Federal, publicou em suas redes sociais, que reproduzo abaixo:

 

“Mais uma vitória da política sobre a economia.

 

Atravessamos o ponto sem retorno na reforma tributária. A sorte está lançada.

 

Acompanho com muita apreensão a aprovação da reforma tributária.

 

Venceu a política, perdeu a economia; venceu a tecnocracia, perdeu a experiência; venceu o academicismo, perdeu o traquejo; venceu o favoritismo, perdeu o espírito público; venceu o mimetismo, perdeu o realismo.

 

A reforma é um salto no escuro que dará início a profundas divergências e graves consequências para colocar o modelo do IBS em pé.

 

Aos poucos a dura realidade da PEC 45 vai aparecer, com consequências econômicas e judiciais conflitantes.

 

E nesse cadinho de divergências surgirá uma contrarreforma para complementar e corrigir pontos polêmicos.

 

Uma reforma pontual e infraconstitucional teria sido mais eficiente e mais rápida para corrigir os defeitos amplamente conhecidos de nosso sistema tributário, e sem a disrupção institucional da PEC 45.

 

A ficha vai cair e ficará claro que esta reforma criará inúmeros problemas econômicos que levarão outras décadas para serem corrigidos.

 

O Brasil está entrando em uma trajetória de enorme desperdício de tempo e de energia.”

 

Faço minhas as palavras dele.

 

Só nos resta orar.


Caio Gottlieb é jornalista, publicitário e editor do blog caiogottlieb.jor.br

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