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12/05/2024

O noivado de Hermann

Hermann havia chegado aos 25 anos, os últimos dois protagonizados pelo namoro firme com Rosita. Com a carreira no serviço público em ascensão e a promoção que o levaria para o sudoeste definida, ele decidiu noivar.

Para oficializar a intenção, foram acampar em uma praia semideserta no litoral de Santa Catarina. À meia-noite daquela nebulosa sexta-feira outonal, os dois deram-se as mãos e seguiram em direção à praia, tentando encontrar a estreita trilha entre o acampamento e o mar.

Hermann, intrépido como soem ser os noivos apaixonados, de repente sentiu o chão desaparecer. Viu-se com o corpo dentro de um riacho, de águas poluídas pelo esgoto da vila mais próxima. Aquele banho de sujeira não tinha nada de romântico, como Rosita pode sentir pelo, digamos, aroma que exalava do corpo do noivo.

Cada vez mais destemido, ele tratou de meter-se nas águas gélidas do mar. Depois de esfregar bem o corpo, viu as luzes de um barco, em meio à cerração. Nadador vigoroso, não titubeou: foi na sua direção. Um tanto ofegante, ao chegar segurou-se em um dos cordames que estabilizava a embarcação.

– Socorro, tem ladrão aqui – gritou uma mulher.

– Vou meter um arpão nele – respondeu uma voz masculina já correndo no convés.

Hermann esqueceu o cansaço e nadou de volta com a velocidade de um Michael Phelps. Rosita resgatou o amado do mar, quase um náufrago de Tom Hanks, e saíram pela areia a procurar algum lugar para descansar. Eis que surge à beira da praia uma casa iluminada, com duas mesas em um deck bem cuidado. Escolheram a mesa que estava vazia e logo foram atendidos por um homem bronzeado, bem vestido, e a quem ordenaram de pronto que trouxesse duas caipirinhas:

– Meus jovens, gostaria muito de atendê-los, mas isso aqui é a minha casa, não o bar da esquina.

Mortos de vergonha saíram os dois para a imensidão deserta, tentando sumir entre a neblina que já dominava tudo. Terminaram a noite comendo hambúrguer em pé, em um contêiner-trailer que também não servia caipirinha. Mas tinha cervejas mais ou menos geladas e uma garrafa de 51, com certeza as responsáveis pela vontade férrea da jovem, que não desistiu do desastrado Hermann.

Hoje, anos mais tarde, o velho nadador relembra a história com satisfação, sabendo que há muito tempo não pode mais nadar. É refém dos 120 quilos que seu corpo carrega, que o fariam afundar como um contêiner – do mesmo tipo daquele em que mataram a fome e a sede na noite de seu vexaminoso noivado.

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