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27/04/2024



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Os doze trabalhos de Hércules

 Os doze trabalhos de Hércules

O tema da resenha de hoje é fruto de um verdadeiro trabalho hercúleo, desenvolvido com os produtores do programa radiofônico Radiocaos: Samuel Lago e Rodrigo Barros.

Logo que retornei à Curitiba, tivemos uma reunião para montar um projeto cultural para a temporada de 2019 do Radiocaos (pra quem não conhece a saga de 25 anos desses rapazes pela poesia, acesse: radiocaos.com.br). Como a temporada se desenrola por doze meses, surgiu a ideia de ligá-la aos Doze Trabalhos de Hércules, sendo cada mês do ano dedicado a um dos Trabalhos. Eu e mais três poetas curitibanos — Monica Berger, Roberto Prado e Thadeu Wojciechowski — fomos convidados para transformar em versos as histórias do semideus, cada um se encarregando de três dos Trabalhos, que foram gravados no estúdio do Radiocaos. Enquanto isso, Samuel e Rodrigo fizeram uma vasta pesquisa sobre as músicas que se encaixariam em cada Trabalho.

Depois da aprovação do projeto pela Fundação Cultural de Curitiba e a captação do patrocínio pelo Grupo Positivo, foram produzidos 52 programas radiofônicos ao longo de um ano dentro do set list do programa Radiocaos. O resultado pode ser curtido aqui.

Além disso, nos dias 13 e 14 de novembro de 2019, os poetas do projeto, Thadeu Wojciechowski, Roberto Prado, Monica Berger e Sérgio Viralobos participaram de duas rádio transmissões ao vivo do Radiocaos Especial, diretamente do Ave Lola Espaço de Criação. A programação, com entrada franca, incluiu a leitura ao vivo de seis dos Trabalhos de Hércules pelos poetas participantes do projeto e contou ainda com a presença dos músicos Yan Lemos e Lucian Satan, no dia 13, e Rapha Moraes que, no dia 14, apresentou o repertório de seu mais recente trabalho, ‘OA’. As apresentações tiveram lotação esgotada no Ave Lola e apoio entusiástico do público presente.

Pois bem, estávamos curtindo o merecido sucesso de toda aquela trabalheira quando recebemos este email:

“Oi Rodrigo e Samuel

Meu nome é Francisco, trabalho no Teatro da USP em Bauru. Na sexta feira, por um acaso de algoritmos, caí num site que não me lembro e vi o projeto sobre o Hércules. Salvei o link para mais tarde e, no sábado de manhã, entre o café e o pão, comecei a ouvir as histórias. No primeiro capítulo, não fiquei empolgado. Achei um pouco poluído demais, porém o que faltava era a contaminação se espalhar… No sábado ouvi uns cinco capítulos, rindo das conexões entre as músicas e o tema em questão (Skyline Pigeons para abrir as aves do Estínfalo foi genial, Feijoada Completa do Chico pra ilustrar o Javali… quase tive um infarto, para dizer alguns). No domingo comi mais uns cinco capítulos. Estou ouvindo as Aves do Estínfalo II agora, realmente feliz de algo inteligente na minha timeline. Parabéns, o projeto é muito bom, as visões que vocês e os convidados invocam em cada capítulo são muito ricas, além das pinceladas em outros mitos. Eu ouvi umas quinze vezes o poema “A Lua de Mel de 300 Anos”, da Monica Berger. Mudou muito a minha visão da antagonista Hera, pintada como uma megera ciumenta sem profundidade. Se for possível, queria esse poema escrito, apesar da leitura da Monica ser sublime! Aliás, poderiam pensar numa publicação de todos os poemas. Esse projeto precisa de mais exposição por aqui, no meio acadêmico, porque traz uma visão muito peculiar sobre o que pode ser uma transmissão de rádio. Ando a pensar numa construção de podcast nesse padrão que vocês fazem… Aceitem meus mais profundos agradecimentos, é um trabalho genial.

Grande abraço.
Francisco Serpa Peres
Orientador de Artes Dramáticas TUSP – Teatro da USP”

Depois dessa, metemos na cabeça que tínhamos que produzir o livro Os Doze Trabalhos de Hércules para perenizar esta obra num meio de comunicação mais tradicional. Entramos com outro projeto na Fundação Cultural e fomos novamente aprovados, além de contarmos com a confiança do Positivo outra vez. E eis aqui o resultado: um livro feito em acabamento de primeira qualidade, ilustrado pelo artista plástico Ralph Spegel e distribuído gratuitamente aos leitores interessados.

Vamos agora à sua resenha. Os Trabalhos foram assim divididos:

1. O LEÃO DE NEMEIA — Roberto Prado

Um leão gigantesco, quase invulnerável, devastava a região de Nemeia, próxima à cidade de Micenas. Hércules tentou matá-lo com sua clava e com seu arco, sem sucesso. Então, encurralou o animal e o estrangulou até a morte.

Realizado o primeiro trabalho, o herói tirou a pele do leão e passou a usá-la como manto.
Roberto Prado abre os Trabalhos com olhos de uma criança que conheceu o Leão de Nemeia através de Monteiro Lobato. Dá pra sentir sua alegria em poder transformar em versos as aventuras de um de seus heróis prediletos.

 

2. A HIDRA DE LERNA — Monica Berger

Na cidade de Lerna, vivia uma enorme serpente com nove cabeças, uma delas imortal. Hércules decepou oito cabeças e Iolau, seu sobrinho, queimou as feridas para elas não nascerem mais. A cabeça imortal foi enterrada num buraco fundo. Ao molhar suas flechas no sangue da Hidra, o herói as tornou venenosas.

Monica Berger fez, a meu ver, as partes mais sublimes da obra. A cena da luta entre Hércules e a Hidra, ele querendo matá-la e ela querendo amá-lo, é de tirar o fôlego do leitor.

 

3. O JAVALI DE ERIMANTO — Sérgio Viralobos

Um javali aterrorizava as vizinhanças do monte Erimanto, no noroeste da Arcádia. Enorme e feroz, ele matava quem cruzasse seu caminho. A tarefa era capturá-lo vivo. O animal foi cercado e, quando se cansou, foi dominado por Hércules.

O ponto alto deste Trabalho é o ensinamento de que a força de nada vale se não for conduzida pela mente. Depois de matar, sem querer, um centauro amigo, Hércules descobre que só com uma estratégia muito bem planejada, e que durou anos, poderia cumprir esta tarefa.

 

4. A CORÇA CERINEIA — Monica Berger

No monte Cerineu, próximo da região da Arcádia, havia uma corça com chifres de ouro e pés de bronze. Ela era muito veloz e tinha que ser capturada viva. Hércules a perseguiu por um ano até os confins do mundo conhecido. Finalmente a capturou durante a travessia de um rio.

Monica usa a prosa poética pra descrever a luta entre duas poderosas deusas: Hera, tentando destruir o semideus, e Ártemis, a favor de Hércules na captura da Corça Cerineia.

 

5. AVES DO ESTÍNFALO — Thadeu Wojciechowski

Num bosque às margens do lago Estínfalo, no norte da Arcádia, escondiam-se aves que, além de devorar as colheitas da região, também atacavam os homens. Para matá-las, Hércules primeiro usou um címbalo (antigo instrumento de cordas) para atraí-las. Assim que as aves saíram do bosque, o herói pôde atingi-las com suas flechas venenosas.

Thadeu descreve esta aventura singular em estrofes com seis versos decassílabos cada, mostrando que a técnica poética não impede que uma boa história seja contada e plenamente entendida.

 

6. CAVALARIÇAS DE ÁUGIAS — Roberto Prado

Áugias, rei da Élida, região a oeste da Arcádia, tinha grandes rebanhos de cavalos (ou gado, conforme a versão), mas não cuidava de seus estábulos, que acumularam uma colossal quantidade de estrume ao longo dos anos. Hércules conseguiu lavá-los num só dia, usando a água de dois rios, cujos cursos desviou com sua força.

Roberto Prado não se furta ao trabalho sujo de descrever um cenário de podridão e fedor de maneira divertida, até o final feliz e limpinho da história.

 

7. O TOURO DE CRETA — Sérgio Viralobos

Por vingança, Poseidon, deus do mar, havia deixado louco um lindo touro pertencente ao rei de Creta, uma ilha grega. O animal devastava os campos da região e Hércules foi até lá para dominá-lo. Após controlar o touro, o herói precisou nadar de Creta até o continente levando a fera consigo.

Neste Trabalho, conto três histórias de touros mitológicos. O primeiro é o raptor de Europa, que a leva no lombo da Ásia até a ilha de Creta, o lugar em que criariam um novo continente. O segundo é o famoso Touro de Creta, que Hércules tinha que levar vivo a Euristeu. E o terceiro é o fruto do amor entre o Touro de Creta e a rainha Parsifae: o Minotauro. Por trás dos três touros fica a dúvida: será que não seria o próprio Zeus se divertindo com o filho bastardo?

 

8. ÉGUAS DE DIOMEDES — Thadeu Wojciechowski

Diomedes, filho de Ares, deus da guerra, vivia na Trácia (região hoje pertencente à Turquia e à Bulgária). Ele tinha quatro éguas ferozes e carnívoras, que alimentava com os estrangeiros que apareciam em suas terras. Hércules capturou as éguas e, notando que elas estavam famintas, serviu-lhes Diomedes como refeição.

Neste Trabalho, Thadeu se utiliza de decassílabos em estrofes de quatro versos pra contar uma das histórias mais intrincadas da epopeia.

 

9. O CINTO DE HIPÓLITA — Monica Berger

Hipólita era rainha das amazonas, tribo de mulheres guerreiras que viviam perto do mar Negro. Ela tinha um belo cinto, desejado pela filha de Euristeu. A mando do rei, Hércules convenceu Hipólita a lhe entregar o objeto, mas Hera incitou as amazonas à guerra e o herói teve que matar a rainha.

Em mais uma bela prosa poética, Monica conta a saga de Hipólita e suas amazonas contra o herói grego. Como a poeta diz no último verso: “O nono trabalho está completo, Hércules venceu mais uma vez. Mas o mundo perdeu o que havia de mais perfeito, o amor sem medo.”

 

10. OS BOIS DE GERIÃO — Roberto Prado

Gerião, um gigante de três cabeças, vivia na ilha de Erítia (possivelmente perto de Cádiz, no sul da Espanha) e possuía um numeroso rebanho de bois. Os animais eram guardados por um pastor monstruoso, Eurítion, e seu cão, ambos com diversas cabeças. Após matar a dupla, Hércules acabou com Gerião, usando sua clava, e entregou os bois a Euristeu.

Roberto Prado nos diverte novamente ao contar a história do maior roubo de boiada de todos os tempos.

 

11. OS POMOS DE OURO DO JARDIM DAS HESPÉRIDES — Sérgio Viralobos

As maçãs de ouro ficavam num jardim desconhecido e Hércules vagou o mundo atrás delas. Segundo alguns textos mitológicos, quem finalmente encontrou os pomos para o herói foi Atlas — que havia recebido de Zeus o castigo de carregar o mundo nas costas. Enquanto Atlas foi atrás das maçãs, Hércules sustentou o mundo em seu lugar.

Este é meu Trabalho favorito. No início, conto a criação do Universo em conformidade com a cosmogonia grega. Depois vem a viagem de Hércules de uma ponta a outra do mundo então conhecido, trombando com mitos como Anteu, Prometeu e Atlas, para encontrar os pomos de ouro do jardim das Hespérides. O final da história é o mais bonito disto tudo.

 

12. CÉRBERO CAPTURADO — Thadeu Wojciechowski

Cérbero, um cão de três cabeças e cauda em forma de serpente, guardava a entrada do Hades, o mundo subterrâneo, permitindo a entrada de todos, mas não deixando ninguém sair. Hércules o capturou e, após mostrar Cérbero a Euristeu, devolveu o cão guardião ao inferno.

Em Cérbero Capturado as estrofes são de versos livres e brancos, até o momento em que o poeta narrador pega a pena novamente, a partir dali as estrofes são de 4 versos até o fim diabólico. Thadeu fecha o livro com uma enorme chave de ouro.

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