Nos meus tempos de criança havia poucos edifícios nas redondezas e a vista da janela do nosso apartamento alcançava a Rua Emiliano Perneta.
Me chamava a atenção a visão noturna do letreiro luminoso vertical escrito: WALLIG O FOGÃO – afixado no prédio da Caixa Econômica da Praça Zacarias.
E lembro de certa noite em que apareceram labaredas e muita fumaça preta no céu.
Logo percebemos que estava ocorrendo um grande incêndio no Centro mas não dava para saber ao certo em qual edificio estava ocorrendo o sinistro.
Como não tinha internet e as notícias demoravam a chegar, ficamos escutando os barulhos dos carros dos bombeiros ao longe e aguardando a diminuição das labaredas.
No dia seguinte viemos a saber que foi no Teatro Guaira. O fogo consumiu e comprometeu a obra que estava praticamente pronta.
Em outra ocasião o pai chegou em casa e falou para a mãe que tinha lido na Pedra da Gazeta que o Leon Pérez CAIU! Só falou essa frase. Não disse mais nada. E ambos ficaram com cara de espanto! (Haroldo Leon Pérez foi governador do Paraná, destituído do cargo pelo presidente na década de 70).
Fiquei esperando a continuação da frase, algo como: – O Leon Pérez caiu “da escada”, – O Leon Pérez caiu “do cavalo”,…
Enfim, qualquer coisa que completasse ou desse um sentido na frase para entender o que tinha realmente acontecido e como eles continuaram sérios, percebi logo que não era assunto de criança. Levei anos para entender que Leon Pérez sofreu um “impeachment”.
E também que a “Pedra da Gazeta” não era propriamente uma rocha lisa e que não escreviam as notícias em cima dela, como na Idade da Pedra. Era uma parede de mármore que tinha no térreo do casarão onde era a sede da Gazeta do Povo, na Rua XV de Novembro, e onde afixavam as notícias do dia.
Lembro de uma ocasião em que o pai conversava com amigos e comentou que fulano tinha na fazenda tantas “cabeças de gado”. Fiquei imaginando aquelas cabeças de gado dispostas uma ao lado da outra e os animais sem cabeça.
Fragmentos de conversas de adultos assimiladas ao pé da letra que ficaram incompreendidas na memória
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(Foto copiada da internet de Yara Querne)