O filósofo Ionesco dizia que o homem deveria estar em um tipo de conflito perpétuo, porque senão deixaria de ser homem. Seria essa nossa sina? É claro que esse conflito a que se referia estaria ligado ao crescimento interior do homem. Parece que a necessidade de fazer escolhas é o que nos evolui.
Por outro lado, no nosso dia a dia, quantas escolhas fazemos sem que nos apercebamos? Desde a hora em que o despertador toca e tenho que decidir se levanto ou se permaneço mais um pouco na cama. Na sequência, que caminho escolher para o trabalho, o mais curto, sempre com trânsito, ou o mais longo, com menos trânsito? Com certeza vai depender se levantei na hora ou protelei. São cascatas de acontecimentos decorrentes de decisões que vão se somando. A questão é que existirão sempre dois caminhos e a decisão é só nossa. E se não tivéssemos escolhido a profissão que escolhemos? E se a opção tivesse sido por não casar? E senão tivessem os filhos? Ficaríamos fora de nosso juízo normal se abríssemos tantos questionamentos em nossas vidas, pois seríamos fruto de nossas dúvidas e não de nossas escolhas. Uma vez decidido, esqueça as outras possibilidades, pois senão ficará num diálogo interno interminável e que não o levará a parte alguma, ou melhor, o levará a um psiquiatra!
Ortega Y Gasset, filósofo espanhol, dizia que uma coisa é o ser e outra coisa é o entorno. Dúvidas existenciais reforçam o que dizia Ionesco, porém dúvidas corriqueiras do dia a dia fazem parte do entorno.
Devemos ver em nós, primeiro, essas pequenas dicotomias, esses pequenos impulsos encontrados que, no entanto, mesmo em sua pequenez, regem muitas vezes os destinos de nossas vidas. Essas pequenas questões vão determinando o que os indianos chamariam de “carma”, individual e pessoal, ou seja, nosso próprio jogo de causas e efeitos.
Toda essa introdução filosófica vem ao encontro ao fato de que muitos pacientes, quando nos procuram em função de seus problemas advindos do estresse, são orientados de diversas maneiras, mas uma lhes é comum, que é a necessidade de atividade física regular. Para isso tem de mudar comportamentos e, eis aí a questão, precisam sair de suas zonas de conforto. Precisam fazer uma escolha entre permanecer como estão, e aí não faria sentido terem buscado ajuda ou atender à recomendação médica e iniciar uma atividade física. Essa é a questão mais difícil, pois para sair da inércia e do comodismo é preciso muita determinação e força de vontade, principalmente porque não há um resultado imediato e sabemos bem como somos naturalmente imediatistas quando algo requer algum sacrifício.
Fazer escolhas de mudanças não é fácil, mas sabemos bem que são necessárias, pois fazem parte do jogo da vida. Relembrando o livro clássico indiano Mahabarata, no capítulo Baghava Gita, onde Krishna, o mestre, aconselha Arjuna, seu discípulo, na passagem da guerra entre os Kuravas e os Pandavas, representação de nossa guerra interna entre o bem e o mal, dizendo-lhe da necessidade de escolher, pois na manifestação da vida tem que se saber para onde se quer ir.
Vivemos em constante diálogo interno, fruto de nossas dúvidas. Com a passagem do tempo, tornamo-nos mais sábios, pelo menos deveríamos, e conseguimos tomar decisões mais acertadas. A isso damos o nome de evolução, crescimento, sabedoria, que pouco a pouco vão condicionando nossa forma de ser.
Por isso, da próxima vez que o despertador tocar ou seu médico lhe indicar atividade física regular, não negocie, não fique com pena de si mesmo e nem dê desculpas, tipo tá frio, tá chovendo, não tenho tempo, estou sem dinheiro, etc… Nada compensa a sensação de arrependimento posterior diante das consequências previsíveis.
Lembre-se que colhemos o que plantamos. Decida-se e boa sorte.
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Desejo seguir este periódico especialmente para acompanhar o brilhante colunista Edimilson Fabri.