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28/04/2024



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Budapeste

 Budapeste

No meu tempo, a professora do primário escrevia o ponto de geografia e história no quadro negro e os alunos copiavam. Sempre iniciando pelo cabeçalho: Curitiba, dia tal do mês tal, do ano tal. A seguir explicava o conteúdo e ditava ou escrevia na lousa um questionário com várias perguntas, que era uma parte da lição de casa.

 

No dia seguinte entregávamos o caderno para a professora. Ela corrigia, colocava um “X” vermelho se a resposta estivesse errada e um “C” azul com a curva de baixo mais alongada se estivesse certa.

 

Finalizava a correção com um carimbo de bichinho e dava uma nota que podia variar entre: excelente, muito bom, bom. As crianças depois decoravam o questionário na véspera da prova.

 

Depois do primário entravam os livros e mudava pouca coisa na metodologia. E assim aprendi tabuadas, a altura do Pico da Neblina, os afluentes do lado direito e esquerdo do Rio Amazonas, as preposições, os estados do Brasil e suas capitais, etc…

 

Mas gostava desse negócio de decorar. Decorava tudo que via pela frente e nem a tabuada do 7 e do 9 tive dificuldade. As capitais sabia na ponta da língua e daí logo quis ir adiante. Saber todas as capitais do mundo. O jogo “WAR” mostrava muitos países e a partir dele não parei mais.

 

Mas tinha uma que eu não queria nem saber de ouvir e muito menos de decorar: Budapeste, capital da Hungria.

 

Sendo uma criança com Transtorno Obsessivo Compulsivo em grau exacerbado, não diagnosticada – porque nem se sabia que existia isso, fazia muitas ligações com palavras e a palavra Budapeste me trazia os piores pensamentos obsessivos.

 

budapeste

 

Era a junção de duas palavras obscuras para mim : “Buda” porque criada em colégio católico, achava que qualquer religião ou filosofia diferente da católica, não era bom nem pensar porque significaria menos fé na religião católica ou até mau agouro.

 

“Peste” porque a palavra significava “morte” e falar isso podia “atrair”.

 

E assim segui a vida evitando saber que Budapeste era capital da Hungria. O que nunca consegui de fato.

 

Para entender como funciona essa coisa de TOC, em uma das variantes, tente escrever uma frase qualquer com uma única condição: – não pode conter a palavra “chulé”. A única coisa que vai vir na tua cabeça quando você for escrever é “chulé” mesmo.

 

E por uma ironia do destino, acabei vindo parar em Budapeste.

 

Nem imaginava vir para cá no início da viagem e confesso que tentei evitar quando surgiu a possibilidade. Estava na Suíça e queria ir direto para Praga.

 

Mas a vontade do filho falou mais alto.

 

 

E depois de passear por Amsterdam, Bruxelas (que foi a mais agradável surpresa), pela encantadora Bruges, Lille, Paris, Grenoble, Interlaken, com suas montanhas revestidas de espécies de árvores com formatos de pinheirinhos de Natal e seus dois lagos límpidos de cor azul clara, que são grande parte resultado do derretimento das geleiras no pico das montanhas, achei que nada mais me surpreenderia tanto.

 

Estava errada. Budapeste é a joia mais bela e rara da Europa, sob o meu olhar.

 

– Magnífica! Deslumbrante!

 

 

A Hungria é um dos países mais antigos da Europa! Fundado em 895 a.C., o país tem muito mais idade que a França, Inglaterra e Alemanha.

 

Além disso, claro, o país faz fronteira com sete outros países: Eslováquia, Áustria, Sérvia, Ucrânia, Romênia, Croácia e Eslovênia, por isso já foi invadido diversas vezes durante sua história, como pelos mongóis, turcos otomanos, romanos, e sofreu muito nas duas grandes guerras.

 

Andar por Budapeste é revolver séculos de batalhas de povos que só ouvimos no tempo de escola.

 

Que a gente estudou pro vestibular e esqueceu tudo mas cada passo aqui faz você ver o quão real tudo foi, porque todas as edificações da cidade – que já foram reconstruídas após as destruições, sempre guardam vestígios das construções originais e mantém a mesma arquitetura.

 

E creiam, é formada pela junção não de duas palavras, como eu temia, mas de duas cidades: BUDA + PESTE separadas pelo Rio Danúbio.

 

Sim, o mesmo rio da famosa valsa: Danúbio Azul.

 

E não pensem que é um riozinho qualquer. É um rio muito largo, acho que uns 500 metros, caudaloso, de águas abundantes, profundas, com forte corrente, por onde trafegam grandes barcos.

 

E essa força, essa intensidade está em tudo: nas águas do Danúbio, nas construções que são todas muito imponentes e parecem que foram erguidas com cálculos de engenharia muito superiores aos que eram suficientes. Muitas pedras, colunas muito grossas, muitos ornamentos e detalhes. E tudo é muito resistente, encorpado, imponente, vigoroso.

 

Não vi uma só construção frágil em ruas, uma só casa com paredes finas ou sem andares, sem enormes janelas com venezianas, portas grandes de madeiras muito nobres, acabamentos em bronze, ferro fundido.

 

 

Tudo tem ferro fundido, que é o ferro que foi derretido e colocado em formas de madeira e areia formando artefatos que são verdadeiras obras de arte. Como os guarda-corpos das sacadas dos prédios, os postes das ruas, as tampas de calçadas e tudo o mais que se pode imaginar. Não se vê nada em plástico e derivados de poliuretano em lugar nenhum, além das lixeiras que ficam escondidas em ruas transversais a partir de horário definido.

 

Até as flores aqui tem cheiro intenso. As rosas cheiram a rosas de verdade. Como as dos jardins de antigamente.

 

 

O Goulash, a comida típica, é um caldo tão revigorante e delicioso que mistura inúmeras especiarias – talvez da culinária árabe, turca, oriental… não sei. Dá vontade de comer só isso a vida inteira. E levanta qualquer um.

 

Enfim, já deu para perceber o quanto Budapeste me impactou. E não há pedintes.

 

O leão é um símbolo que está presente em tudo. Em monumentos e em detalhes dos edifícios.

 

 

 

Realmente a expressão do olhar dos leões em pedra e ferro fundido que avistei na cidade e também uma grande águia no alto de um castelo que imaginei ser uma fênix – passam essa força, essa garra, essa bravura e essa obstinação de sempre se reerguer, apesar dos pesares.

 

Tem a língua muito difícil. Não tem uma palavra que se pareça com inglês, alemão, francês, italiano. É quase pior que o chinês. Vi palavras escritas com 3 tremas e um acento agudo.

 

E se vc quer relaxar depois de tanta cultura, as águas termais de Budapeste são atração para o mundo todo. São muitos locais, super higienizados com águas quentinhas. Sai morto mas daí toma um goulash e ressuscita.

 

Leia outras colunas da Karin Romanó aqui.

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