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28/04/2024



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Porque Curitiba deu certo (aos olhos de uma curitibana, curitiboca)

 Porque Curitiba deu certo (aos olhos de uma curitibana, curitiboca)

Todo mundo que mora aqui tem o maior orgulho de dizer que é de Curitiba.

 

Mas afinal, o que Curitiba tem que se tornou assim tão especial? E por que os visitantes ficam tão encantados com este lugar?

 

Será a limpeza, serão os parques?

 

Não é só isso, não! Vou fazer uma retrospectiva sob minha visão, às vezes com ordem cronológica não muito exata. Mas tentarei juntar tudo e facilitar o entendimento.

 

Quase uns 200 anos depois do descobrimento do Brasil, Curitiba foi fundada.

 

Isso aconteceu quando desbravadores vieram de São Paulo em direção ao Sul, através do litoral e resolveram subir a serra do mar. EM BUSCA DE OURO.

 

E mesmo não achando grande coisa aqui, acabaram ficando.

 

Para sobreviver no meio do nada, praticaram uma economia de subsistência. E assim foi por longos anos. .

 

Foi então que teve início o TROPEIRISMO, no início de 1800.

 

Os tropeiros eram pessoas que traziam o gado (mulas, burros, cavalos, bois, vacas, etc) de uma cidade gaúcha chamada VIAMÃO até a cidade de SOROCABA (interior de São Paulo). Eram locais onde havia feiras muito grandes e pessoas vinham de longe para adquirir mercadorias e animais que necessitavam.

 

Acontece que Curitiba estava no meio de VIAMÃO e Sorocaba. Bem na metade do caminho.

 

Ao chegar aqui nos arredores de Curitiba, os animais sempre estavam exaustos, magros e sem condições de continuar andando até Sorocaba.

 

Então os tropeiros tinham que parar para o gado descansar e recuperar o peso perdido.

 

Para fazer isso, alugavam sítios, locais que tivessem bom pasto para os animais engordarem e descansarem. Eram as INVERNADAS.

 

Os tropeiros locavam geralmente por 1 mês. Locavam os pastos e as casas dos donos, para acomodações dos tropeiros e suas famílias.

 

E assim os donos de sítios se mudavam temporariamente para o centro de Curitiba. E ali também alugavam pousadas para ficarem durante esse mês com esposa e filhos.

 

Desta forma pessoas foram abrindo pequenos comércios de secos e molhados, tecidos, arreios, selas, panelas, agasalhos, instrumentos agrícolas,… para atender as necessidades dessa população.

 

Eram pessoas que vinham com o dinheiro que tinham recebido dos tropeiros.

 

E podiam comprar mantimentos, roupas, utensílios e o que necessitassem.

 

Assim, os comerciantes foram se estabelecendo e durante muitos anos a economia foi girando e aumentando pouco a pouco o comércio do Centro.

 

A erva mate já existia. Aliás, tanto a erva mate como o pinheiro estavam aqui desde sempre, ninguém precisou plantar. Plantas nativas.

 

E alguém já tinha mostrado aos curitibanos a importância da erva mate; os próprios índios que aqui habitavam já utilizavam.

 

Os tropeiros comercializavam um pouco desta erva mate levando de um estado para outro e entrava um dinheirinho.

 

Até que alguém chegou e mostrou como se beneficiava a erva mate:

 

Não era só colher os ramos e folhas, amarrar num couro de boi e vender. Assim a erva não tinha gosto de nada se fervesse, era como tomar chá amargo, pior que boldo.

 

Tinha que ser realizado um processo após colher e a própria colheita tinha que ser feita em determinadas horas do dia.

 

Depois era necessário fazer tipo um varal ou um caramanchão com madeiras e cipós.

 

E em cima desse caramanchão esticar os ramos da erva mate com as folhas.

 

Em baixo, bem no meio, colocar fogo mas não deixar as chamas alcançarem as folhas.

 

Somente o calor podia chegar na planta e a fumaça tinha que sair pelos lados. Não defumar as plantes e sim caramelizar.

 

Depois tinha que esfriar e bater para tudo virar farinha.

 

E assim tinha-se a erva do chimarrão. Essa erva era resultado das folhas e dos raminhos juntos moídos formando aquela erva verdinha.

 

Para fazer o chá mate que se toma hoje, usava- se só as folhas, sem os raminhos.

 

Tinha mais uns processos envolvidos mas não vou alongar.

 

Só que o negócio ficou realmente bom quando o primeiro engenho de erva mate foi criado aqui no litoral e a erva passou a ser beneficiada. O valor de venda passou a ser totalmente outro.

 

Os engenhos do litoral eram movidos à água dos rios.

 

Depois construíram engenhos em Curitiba, já com energia movida à vapor (à lenha).

 

Foram vários empreendedores que construíram engenhos. E a erva mate passou a ser produzida cada vez mais e exportada para Argentina e Uruguai. Eram os dois países que consumiam o produto em abundância.

 

O Paraguai também produzia erva mate mas o presidente paraguaio proibiu a exportação e permitiu que fosse a erva deles fosse usada somente para suprir o consumo interno.

 

Isso levou o Paraná a vender ainda muito mais.

 

E o dinheiro foi entrando em abundância e os donos de engenhos ( ervateiros) queriam construir casas diferenciadas, bonitas. A residência era algo que realmente distinguia as pessoas bem sucedidas.

 

Para isso contratavam arquitetos que eram da Europa ou que construíam nos moldes de lá.

 

E foi um pouco antes que o Império e todos perceberam a importância da erva mate e o Paraná se emancipou. Deixou de ser Província de São Paulo. Em 1853.

 

Depois disso, viram a importância de construir uma estrada que ligasse a capital ao litoral e foi construída a Estrada da Graciosa. Iniciada logo depois da Emancipação.

 

Antes a erva era levada em mulas e bois pelo Caminho dos Tropeiros, tipo picada.

 

E as mulas e carros de boi passaram a levar a erva mate até o Porto de Paranaguá agora na estrada recém construída.

 

E logo após, em 1880, D Pedro II lançou a pedra fundamental para a construção da ferrovia Paranaguá – Curitiba.

 

Dessa forma estaria muito mais completa a rota de exportação da erva mate.

 

Um pouco antes dessa época, o Brasil passou a atrair os imigrantes.

 

Os agentes na Europa distribuíam panfletos e ficavam nas estações de trem com promessas de terras abundantes, isenção de impostos por longos anos, enriquecimento através do corte de madeiras, plantio, …

 

Dessa forma vieram muitos imigrantes de diversos países da Europa como os alemães, italianos, poloneses, ucranianos e mais ainda libaneses, sírios, japoneses, etc

 

Uma característica importante é que os imigrantes vinham já com conhecimento.

 

Seja por já terem trabalhado como oficiais de construção, em selarias, em conserto de arreios, no feitio de chapéus e roupas, na confecção e preparação do couro,…

 

Não eram pessoas despreparadas de tudo, analfabetas,… Geralmente vinham em busca de um sonho mas já eram estabelecidos em seus países. Muitos fugiam de perseguições e guerras na Europa.

 

E como já citei, todos traziam um conhecimento e aqui tiveram a oportunidade de empregar.

 

O polonês nos mostrou como confeccionar uma carroça com maestria. Assim como casas em madeiras.

 

O alemão era construtor de casas em alvenaria trazendo as técnicas de construção da Europa, com estilos mais aprimorados, com telhados verticais, grandes janelas, balaústres, platibanda, frontão e colocação de monumentos, construção de casas com porão e sótão. Italianos idem.

 

Outros eram ferreiros. Sabiam trabalhar o ferro puro (mais mole) e, através do ferro e bigorna, faziam trançados com formatos de flores e vários motivos delicados nos gradis, pequenas sacadas).

 

E esses imigrantes foram ensinando seus ofícios aos brasileiros já aqui instalados.

 

Muitos daqui se aperfeiçoaram e chegaram a superar os mestres. Um bom professor faz um bom aluno.

 

E assim Curitiba, com essa mistura de etnias, conhecimentos, costumes, foi se construindo e embora inicialmente nem tenha sido planejada, acabou saindo melhor que a encomenda.

 

Desde cedo os códigos de posturas estabeleceram normas rígidas para construírem casas maiores e com 2 ou 3 pavimentos nas principais ruas centrais.

 

Casas de madeira somente mais afastadas e sempre com aquela franjinha simpática das casas polonesas.

 

Casas na região central sempre com a frente de alvenaria.

 

E foi criado o Passeio Público para o entretenimento das famílias. E as ruas e calçadas foram pavimentadas, instalação de água e esgoto, luz elétrica nas ruas e casas, telefonia,…

 

E com o dinheiro circulando cada vez mais, saindo dos ervateiros para os construtores, olarias, pagamento da mão de obra, madeiras, frete,…

 

…o comércio foi crescendo com cada vez mais armazéns, lojas de roupas finas 0ara atender as famílias abastadas e comércio msis popular para atender a toda a população.

 

E todos ganhando dinheiro, seja os ervateiros como os comerciantes, houve uma pressão para ser criada uma universidade local para os filhos estudarem.

 

E assim a Universidade do Paraná foi criada. E os filhos desses imigrantes se tornaram engenheiros, médicos, advogados.

 

A segunda geração dos imigrantes já não teve o mesmo interesse em continuar os negócios dos pais e resolveram seguir as profissões liberais em que se formaram.

 

Nesse momento os árabes (sírios, libaneses) e também judeus se fortaleceram no comércio ocupando muitos estabelecimentos comerciais centrais.

 

E cada grupo seja alemão, negro, poloneses, ucraniano, italiano, árabe, judeu, etc criou uma instituição cultural, esportiva, social, os clubes, com seus folclores, e se reuniam para entretenimento.

 

E a cidade foi se aformoseando, colocando paralelepípedos nas ruas, criando praças, planejando as árvores. As árvores das praças nunca eram nativas.

 

E a população também tinha sede de cultura, teatro, música, cinema, praticar esportes.

 

E foram se criando teatros, cinemas, locais de dança, agremiações esportivas.

 

E é o que fomos e somos até hoje. E que ainda reverbera e repercute. Por mais que o mundo tenha mudado, as raizes plantadas lá atrás estão presentes.

 

Essa mistura de raças e povos que trouxeram seus costumes ainda é muito presente. Uma mistura de ingredientes perfeita.

 

E Curitiba é assim! Nem que se planeje mil anos é possível construir uma Curitiba de novo.

 

Graças que tivemos um Prefeito Cândido de Abreu

 

Graças que tivemos um Jaime Lerner

 

Graças que temos um Rafael Greca e muitos outros que deixaram a sua marca e fizeram o melhor que podiam…

 

Não tenho dúvida de que administraram a cidade com muito amor.

 

Ah! O chimarrão e a cuia são paranaenses. O povo daqui não fixou e acabou virando mais patrimônio cultural dos gaúchos!

 

Mas vocês podem ter uma dúvida:

 

-Como é que vendiam tanta erva mate suficiente para enriquecer tanto essa cidade?

 

Eu mesma não gosto de chimarrão e não tomo mate. Os meus familiares, conhecidos idem…

 

Mas é que chimarrão e cuia combinavam com as noites frias de Curitiba e naquela época nem se tinha opções tipo suco, refrigerante, energético, sorvetes, pipocas, choppinho gelado, guloseimas em mercados.

 

Era algo que se tinha, até matava a fome e tinha um ritual envolvido… ideal paraencontros de amigos, conversas em famílias,…

 

E assim quase todo mundo tomava.

 

Leia outras colunas da Karin Romanó aqui.

2 Comments

  • Um passeio pela história desta cidade que me acolheu há quase quarenta anos

  • Karin. Vc sempre nos enriquecendo com seus textos impecáveis. Obrigada pela dedicação e aulas de cultura.

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