Francisco de Paola veio da Itália para o Brasil antes da virada do século.
Trabalhou duro, prosperou e adquiriu muitos bens, como terrenos no Alto da XV onde hoje está o Hospital Osvaldo Cruz e outros.
Tinha um armazém de secos e molhados chamado “Casa Mascote”, na esquina da Rua Dr. Muricy com a Praça Zacarias (onde hoje é a Casas Pernambucanas).
Vendia louças, joias, artigos importados e uma miscelânea de artigos.
Teve cinco filhas mulheres e como queria muito um filho homem para dar continuidade nos negócios, pediu ao irmão que tinha ficado na Itália e que tinha oito filhos homens, que mandasse o mais velho para cá.
Chiquinho ou Francesco de Paolo Sobrinho chegou no Brasil com 9 anos. Logo mostrou talento nato para o comércio.
Foi matriculado na escola mas enquanto a professora ensinava os rios e montanhas, as paroxítonas e preposições, seu pensamento voava bem longe.
Gostava mesmo era de ficar grudado no guarda livros (contador) do tio, Sr Loyola, tentando entender os cálculos e procedimentos nas transações comerciais.
Não teve como segurar.
Aos 16 anos já tinha negócios próprios ligados à venda e importação de madeira, à pesca e outros produtos.
Junto com o tio ia até os armazéns de Paranaguá escolher e trazer as louças, perfumes, relógios, panelas, etc, para vender na loja.
Tinha um bom faro para selecionar os produtos que agradavam aos clientes.
Não tardou e comprou a Loja MASCOTE, bem como os armazéns alugados do tio, na Praça Zacarias.
As lojas alugadas ficavam assim dispostas: na Rua Dr. Muricy ficava a “Loja Mascote”. Na esquina da Rua Dr. Muricy com a Praça Zacarias locava para Dona Joana, uma alemã que fazia deliciosas broas, cuques, stollens, tudo preparado no estilo alemão.
A loja ao lado, em direção à Praça Zacarias, era o Armazém ISKANDAR, onde se vendiam doces importados, figo, tâmaras, molhos, temperos e outras coisas boas importadas.
Seu Chiquinho passava lá todos os dias e comia figo grego e tâmaras e, no final do mês, Sr. Iskandar descontava do aluguel, o que deixava o Sr. Chiquinho indignado.
A loja a seguir era locada para a Empresa Japonesa de Pesca.
Na verdade, Sr. Chiquinho era sócio dessa empresa de pesca e, junto com o japonês, tinham barcos em Paranaguá, uma fábrica de gelo e um depósito em Água Branca, São Paulo.
Isso possibilitava enviar pescado refrigerado para várias cidades.
A próxima loja já não pertencia a ele. Era do Sr. Bonato, cuja filha casou com o ex-prefeito Maurício Fruet, madeireiro.
Depois era a Loja Maçônica.
Em frente à Loja Mascote, na Muricy, ficava um prédio de três andares, de propriedade da família Sanson.
Na esquina da Rua Dr. Muricy com a Marechal Deodoro ficava também outra propriedade (ainda em pé), da família Sanson (onde era o Snooker 21).
A casa a seguir, na Marechal Deodoro, era da Família LATTES (do cientista César Lattes).
Em frente à Praça Zacarias, na esquina da Muricy com a Marechal Deodoro, ficava uma propriedade do Sr. Álvaro Leal, onde depois construíram o CINE LUZ.
Seguindo pela Marechal Deodoro, em direção à Rua Emiliano Perneta, do outro lado da Praça Zacarias, ficava a propriedade da família ABAGGE.
Tudo ia bem até que o Brasil entrou na Segunda Guerra, quando declarou guerra contra a Itália, Alemanha e Japão.
Chiquinho nascera na Itália. Mas era brasileiro e amava este país.
Nesse dia quando o Brasil declarou guerra, baderneiros começaram a depredar todos os estabelecimentos comerciais de imigrantes alemães, italianos e japoneses que moravam aqui em Curitiba.
A Casa da Dona Joana, de produtos alemães, foi totalmente depredada. Vidros quebrados, móveis jogados para fora.
A empresa de pesca foi colocada abaixo e o cofre da empresa, a golpes de picareta, foi retirado, aberto e jogado no meio da praça.
A Loja Mascote que ficava no mesmo imóvel, mas voltada para a Rua Dr Muricy – idem, tudo foi revirado, quebrado e os documentos espalhados pela praça.
Nada sobrou. Resignados, juntaram o que deu e serraram as portas.
Na casa da família Lattes, eles só não depredaram tudo porque a mãe do cientista César Lattes mostrou a bandeira brasileira para fora da janela.
Depois veio o confisco de todas as casas de veraneio.
Nenhum imigrante dos países inimigos podia ter casas perto do mar.
E Chiquinho perdeu a casa e o armazém em Paranaguá, a fábrica de gelo e os barcos.
E não podiam ter rádio. Tudo foi confiscado.
Nilda, a filha de Chiquinho, fez 15 anos nesta época e como os italianos e alemães não podiam se reunir, teve que pedir licença e autorização para a polícia para festejar em casa com primas e amigas da escola.
Chiquinho perdeu tudo, ficou bem desanimado mas teve que recomeçar.
Foi ao encontro de um primo brasileiro que se chamava Dante e que tinha uma serraria em Palmeira, casado com uma senhora da família Malucelli Sanson.
E recomeçou, aproveitando o armazém em Água Branca – São Paulo, como entreposto.
Passou a vender madeira para todas as grandes empresas de móveis e de materiais de construção.
E paralelamente passou a construir casas e predinhos.
Na ocasião em que a Casas Pernambucanas mostrou interesse de locar um grande imóvel ali na região da Praça Zacarias, Seu Chiquinho se adiantou e pediu os imóveis aos inquilinos.
Chiquinho demoliu tudo e construiu uma loja grande, de dois andares, conforme os moldes que a Casas Pernambucanas buscava e locou para eles.
E em cima fez mais um andar e alugou para o Restaurante Zacarias.
A porta a seguir, em data bem mais recente, ficou para a Confeitaria Lancaster (da própria familia).
Um homem baixinho, amigo de todos, trabalhador incansável, carismático, italiano de origem, brasileiro de todo o resto.
Em um momento de revolta, falou alto na barbearia (no local onde depois ficou sendo a Foto Brasil):
– Agora vou falar italiano, aqui ou na caixa-prego! (falar italiano ou alemão em público era proibido. E naquele momento havia um secretário do interventor Manoel Ribas na barbearia).
Foi preso.
Mas Chiquinho deu a volta por cima. O prédio das Pernambucanas permanece na família.
As informações foram dadas pela filha do Chiquinho, Nilda de Paola Gonçalves.
Leia outras colunas da Karin Romanó aqui.
Não canso de ler suas histórias. Adoro.