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02/05/2024



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Venturas e desventuras no Colégio Estadual

 Venturas e desventuras no Colégio Estadual

Tive a ventura de estudar no Colégio Estadual do Paraná, na era do gelo em Curitiba – fazia muito frio naqueles tempos imemoriais em que troquei os dogmas religiosos do Colégio Santa Maria pelas discussões políticas, exacerbadas nos dias do golpe militar de 1964.

 

A turma do CS (Ciências Sociais) era privilegiada. Não só pelas matérias ministradas, das quais não faziam parte aquelas de ciências exatas ou biológicas, mas pela alta qualificação dos colegas de classe. Ali vicejavam cinco filhos de deputados (Edgar Távora Júnior, Ruy Cunha Sobrinho, Fernando Gama, Vidal Vanhoni e Jorge Maia), o primogênito do diretor-geral da Assembleia Legislativa (Heitor Valente), um dos filhos gêmeos da chefe do cerimonial do Palácio Iguaçu (Henrique Gomm Neto) e o mais brilhante de todos, Penrose Emory Checchia Franklin, cujo pai tinha sido diretor do Colégio e a mãe era médica de prestígio. Além deles, havia figuras importantes do jet-set paranaense, como Vicente Ciccarino Neto e Omar Camargo Filho, sócios do Country Club.

 

No entorno de tantas personalidades, circulavam os comuns mortais, entre os quais me incluía, ao lado de, por exemplo, Jarbas Sponholz, Álvaro Nunes, Adão Laslowski, Werney Serafini, Luiz Fernando Queiroz, José Antônio Salvadori, Júlio Cesar Zago, Jacques Mário Brand e Antônio Busnardo. Outras figuras eram detentoras de sobrenomes já extraviados nas brumas da memória: Antônio Cavalo, Nilo Tarado, Telmo, Russo e sei lá quantos mais.

 

A turma se excedia em todos os quesitos, não só os curriculares. Certa vez promovemos o enterro de um professor de Filosofia, com Henrique Gomm puxando o féretro, a pronunciar um latinório incompreensível pelos corredores. Depois, Penrose, Ruy e eu fizemos um manifesto político pichando a sala de aula com giz de todas as cores, em que reclamávamos, entre outras coisas, que a borracha era nossa, mas estava nas mãos da polícia. No dia do encerramento das aulas, às vésperas do vestibular, enchemos a fonte na entrada do colégio com sabão em pó. Desta última cretinice escapamos incólumes, das outras curtimos uns dias de suspensão.

 

Foi também o que sofri, por um ato em que fui mero coadjuvante. Durante uma aula de geografia – o professor pronunciava “canhões” em vez de canyons, “oio” em lugar de Ohio – de tal forma que era uma bagunça. Em certo momento, enquanto escrevia alguma coisa na lousa, Nilo Tarado e o Russo resolveram fazer uma corrida de motos, cada qual empunhando sua carteira escolar e fazendo os sons de aceleração com a boca.

 

Para colaborar com o empolgante desafio, levantei-me da carteira e, munido de um lenço, me preparei para a largada, como se estivesse em uma pista de corrida. Foi quando o professor se virou e me viu em pé, agitando o lenço para liberar os dois corredores.

 

– Fora da sala, berrou. Suspenso três dias das minhas aulas!

 

Tentei argumentar:

 

– Mas, professor. Eu só estava dando a largada…

 

– O que? Então, uma semana de suspensão!

 

Aquilo não me incomodou. Passei as aulas seguintes de Geografia andando de pedalinho no Passeio Público, ali ao lado. Os dois corredores, refeitos da estressante disputa, disseram que aquela prova foi a melhor que tiveram a ventura de correr.

 

Leia outras colunas do Ernani Buchmann aqui.

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